Desigualdade no Brasil: Raízes Históricas e Caminhos para a Transformação Social

Este artigo analisa dados alarmantes que evidenciam a extrema desigualdade socioeconômica no Brasil, explorando como legados históricos – desde a colonização até a Lei de Terras de 1850 – moldaram a realidade atual. Além disso, propõe reflexões e estratégias integradas envolvendo poder público, movimentos sociais e novos modelos de negócios para a construção de um futuro mais inclusivo.

Marina Queiroz

4/1/20253 min read

O Brasil é um dos países mais desiguais do mundo, com altos índices de desigualdade social e econômica que afetam diretamente o acesso aos direitos básicos. Essa desigualdade aprofunda disparidades em diversos setores – como educação, trabalho, renda e meio ambiente – e impacta grupos historicamente oprimidos, como mulheres, pessoas negras, indígenas e quilombolas.

De acordo com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), o 1% mais rico da população detém 28,3% da renda total do país, evidenciando uma alta concentração de riqueza. Além disso, apenas 1% dos brasileiros possui quase metade da riqueza nacional, enquanto os 50% mais pobres detêm apenas 2% do patrimônio (CNN Brasil, 2024). O Índice de Gini, que mensura a desigualdade de renda, posiciona o Brasil entre os dez países mais desiguais do mundo, com um coeficiente de 0,539 em 2018 (Senado Federal, 2021).

Na área da educação, os desafios são igualmente alarmantes. Apenas 56% das crianças estão alfabetizadas até o 2º ano do Ensino Fundamental (Instituto Rui Barbosa, 2023). O Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) não atingiu as metas em 2023, registrando 5,0 para os anos finais – contra uma meta de 5,5 – e 4,3 para o Ensino Médio – abaixo da meta de 5,2 (INEP, 2023). A desigualdade se acentua ainda mais quando observamos o desempenho em Matemática e quando realizamos o recorte raça e Nível Socioeconômico (NSE): entre estudantes dos anos finais com baixo NSE, apenas 10% atingem o aprendizado esperado, enquanto esse percentual sobe para 26% entre os estudantes de alto NSE. Em termos raciais, estudantes pretos e indígenas apresentam apenas 12% de proficiência em Matemática, bem abaixo dos 25% observados entre estudantes brancos (QEdu, 2023).

No mercado de trabalho e no empreendedorismo, essa desigualdade também se manifesta. O empreendedorismo feminino enfrenta barreiras estruturais, como acesso limitado ao crédito, capacitação e redes de apoio. Segundo o Global Entrepreneurship Monitor (GEM), apenas 8,9% das mulheres empreendem por oportunidade, enquanto 42,3% o fazem por necessidade (GEM, 2022). Em termos de insegurança alimentar, 21,1 milhões de brasileiros enfrentaram fome em 2023, sendo que 22% dos domicílios chefiados por mulheres negras estão nessa situação (UOL, 2024). Apesar de as mulheres representarem 34% dos empreendedores no país (Sebrae, 2023), apenas 9,9% das startups ativas são lideradas por elas (Distrito, 2022) e menos de 3% das startups recebem investimento de capital de risco (Associação Brasileira de Startups, 2021). O cenário se agrava para as mulheres negras: somente 0,04% das startups fundadas por mulheres negras recebem investimentos (BlackRocks Startups, 2022).

Esses números refletem não apenas a realidade atual, mas também as profundas raízes históricas que moldaram a estrutura socioeconômica do país. Ao analisar a história da América Latina, e em especial do Brasil, podemos compreender melhor esses dados. Durante o período colonial, a exploração das terras e dos recursos naturais foi pautada por uma lógica de exclusão e acúmulo de riquezas. A promulgação da Lei de Terras de 1850, por exemplo, facilitou a concentração fundiária nas mãos de poucos, beneficiando aqueles que já dispunham de capital, mesmo num momento em que a abolição da escravatura ainda não havia se consolidado. Essa legislação foi determinante para a formação de uma estrutura social profundamente desigual, cujos efeitos reverberam até os dias atuais.

Refletir sobre esse passado é fundamental para entender os desafios presentes e os caminhos para um futuro mais justo. Apesar dos avanços em diversas áreas, ainda temos um longo percurso a enfrentar. Para mitigar essas desigualdades, é fundamental adotar medidas em múltiplos níveis:

  • Papel do Poder Público: A criação e implementação de legislações e políticas públicas que promovam a justiça social são imprescindíveis. O Estado deve ocupar espaços de discussão e construção de soluções que garantam o acesso aos direitos fundamentais.

  • Movimentos Sociais e de Base: A atuação dos movimentos sociais e das organizações da sociedade civil é vital para pressionar e acompanhar as políticas públicas, bem como para promover ações que garantam direitos sociais.

  • Novos Modelos de Negócios: Novos modelos empresariais, como as empresas 2.5, que equilibram a busca pelo lucro com um forte compromisso social, demonstram que é possível unir sustentabilidade financeira e impacto social. Iniciativas que direcionam recursos, conhecimento e apoio para transformar realidades – como o trabalho da Cyrcular – exemplificam essa tendência, contribuindo para a criação de oportunidades e para a redução das desigualdades.

Ao olharmos para nossa trajetória histórica, avançamos no entendimento dos fatores que perpetuam a desigualdade, mas também nos deparamos com a necessidade de vigilância constante para não retroceder. A transformação social requer uma ação conjunta e integrada, onde o poder público, a sociedade civil e os novos modelos de negócios se unem em prol de uma sociedade mais inclusiva. É nesse movimento coletivo que reside a esperança de construir um futuro onde o acesso aos direitos e às oportunidades seja realmente equitativo para todos.